Nacional

Agravamento da pobreza

Henrique Pinto
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«São cerca de 20 a 24% os que vivem no limiar da pobreza em Portugal» - concluem os participantes do IV Congresso da CAIS

O IV Congresso CAIS opôs a visão economicista, monetária e laboral da pobreza ao sublinhar a sua multidimensionalidade, e distinguiu a exclusão da pobreza, ao associar a primeira à vida no geral, definindo assim a exclusão como exclusão da vida. São cerca de 20 a 24% os que vivem no limiar da pobreza em Portugal. O Congresso assinalou um agravamento da pobreza nos últimos anos, e os seus rostos mais visíveis são os idosos, os desempregados de longa duração, os desempregados recorrentes, as famílias monoparentais, as minorias étnicas e os que vivem da pequena agricultura, nos sítios mais isolados e abandonados do país. Por seu lado, os rostos das pessoas excluídas da vida continuam a ser, entre outros, os sem-abrigo, os ex-reclusos, os toxicodependentes e os seropositivos. A descontinuidade das políticas foi apontada, com muita frequência, como sendo um dos principais factores que nos tem vindo a tornar incapazes de erradicar a pobreza e exclusão, em Portugal. Neste sentido, o Congresso denunciou a manipulação das duas problemáticas para fins eleitoralistas e o branqueamento de comportamentos, mascarados de boas práticas, conduzidos quer pelo Estado quer pela sociedade civil no geral. O Congresso reforçou o direito à diferença, no sentido de que todo o ser humano tem o direito de se inventar a si mesmo. A auto-exclusão, entendida como forma de vida é também um direito de cada um, pelo que a inclusão não deve ser nunca uma prática coagida, e quando exercida, ela deve fazer espaço à auto-criação e experimentação das pessoas. O Congresso denunciou a produtividade e a competitividade partida e segmentada do actual modelo económico e ao falar da escola, como espaço de experimentação, falou da solidariedade como valor, não apenas ético, mas científico, fundado na interdependência do existir, e propôs, pelo traço das ciências pós-modernas, aquilo a que chamou de educação para a competitividade e produtividade solidária. A chegada da produtividade a Portugal tem vindo a matar os afectos, não deixando qualquer tipo de espaço para a gratuidade dos encontros entre pessoas, dentro e fora do ambiente familiar. Assim, torna-se urgente vestir a produtividade das sensações, emoções e afectos, característicos da relação entre seres humanos. O congresso sublinhou ainda a importância dos Media na defesa e divulgação dos direitos de cada um, e de como estes também devem ser utilizados pelas organizações cívicas. O congresso falou da importância do empreendorismo e do associativismo para que todos disponham dos meios mais adequados capazes de garantir e salvaguardar os direitos de cada um. Os técnicos foram encorajados a manter uma constante formação interdisciplinar, evitando que cada um se torne prisioneiro de métodos e modelos, tornando-se, assim, promotores de uma relação o mais próxima possível da realidade, através de uma análise constante e crítica dela mesma e da forma executiva como lidam com ela. Às empresas o Congresso deixou o desafio de se tornarem, dentro das comunidades onde exercem o seu trabalho, empresas cidadãs, abertas à diferença e ao potencial de cada um. O Congresso sublinhou que a economia faz parte do governo da relação entre pessoas e que esta deve ter por finalidade, na oferta de bens e serviços, o bem-estar dos cidadãos. O Congresso opôs, uma vez mais o modelo de integração assistencialista, e propôs o empowerment dos públicos alvo, ou seja, processos de acompanhamento onde cada individuo é actor e protagonista principal na reconstrução da sua autonomia e independência relacional. O Congresso falou do estado relacional das coisas e da importância de critérios de representatividade, tais como a transparência, expertise e accountability das organizações cívicas, com vista o estabelecimento de parcerias. Nestes termos, o Estado não deve ser um entrave, mas facilitador, proporcionando ambientes favoráveis à criação, gestão e desenvolvimento sustentável de organizações cívicas. O combate à pobreza e exclusão deve acontecer a nível interministerial, deve convocar todos, num pacto social coeso e deve dar tempo ao tempo, sem medidas a curto prazo e longe dos dividendos eleitoralistas. Em síntese, a luta contra a pobreza e exclusão deve ser um imperativo nacional das democracias, deve contar com a participação coesa de todos, porque nesta, como noutras tarefas, não há portugueses dispensáveis – tal como o referiu o Presidente da República no discurso de abertura.


Solidariedade