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Dia Mundial dos Pobres: Atelier musical é caminho para inserção e validação de pessoas sem-abrigo

Agência Ecclesia
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Foto: Centro Social São Francisco Xavier, Arraial da instituição
Foto: Centro Social São Francisco Xavier, Arraial da instituição

Mudança de vida é operada a partir de caminho conjunto entre utentes e funcionários

Setúbal, 18 nov 2017 (Ecclesia) – O Centro Social São Francisco Xavier, na diocese de Setúbal, promove, através de um atelier musical, a integração de pessoas sem-abrigo.

“A arte, a música, o teatro, a fotografia são ferramentas privilegiadas que nos permitem aceder a este tipo de dimensões de forma mais profunda. Trata-se de um autocaminho que as pessoas fazem em ação”, explica à Agência ECCLESIA a psicóloga Ana Gaspar que integra uma equipa disciplinar.

O atelier musical teve início há dois anos quando o Centro sentiu que as respostas que tinham não eram suficientes para responder aos desafios de uma população fragilizada como era as pessoas sem-abrigo na região de Setúbal.

“Não há transformação sem haver primeiro validação. Como é que me consigo transformar se eu não me conheço, se não vou ao fundo de mim, da minha essência”, questiona a psicóloga.

Acompanhados ao piano pelo professor Carlos Xavier, os utentes vão aprendendo “algumas técnicas para estar em palco, saber estar com o outro” e, progressivamente, “cantar em conjunto”.
“O que eu fiz em primeiro lugar foi perceber quais seriam as canções significativas na sua vida.

Podiam ser ou não auto biográficas, poderiam falar de uma perda ou dor, mas nós não teríamos de saber isso”, esclarece o professor que assume este trabalho voluntário.

O espaço do atelier musical permite quebrar barreiras que anos de rua ajudaram a erguer.

“Depois, pusemo-los a dançar. No início tinham vergonha de se tocar. Traziam as representações da rua e na rua as pessoas não se tocam ou só se tocam pela força”, sugere.

Hoje no atelier não se distinguem utentes e técnicos pois, afirma Ana Gaspar, o centro social “é uma casa de afetos” cuja “repercussão máxima” se atinge nos espaços artísticos.

No grupo que participa no atelier estão pessoas que estiveram no encerramento do Jubileu da Misericórdia, em 2016, ocasião em que o Papa Francisco convocou o Dia Mundial dos Pobres.

António Alexandre mantém no pulso a pulseira que há um ano atrás lhe deu acesso à primeira fila para ouvir o Papa falar dos pobres.

“Daqui não desaparece, só quando eu morrer”, afirma prontamente o antigo pescador de 70 anos, que encontra no Centro Social São Francisco Xavier um espaço onde o tratam bem.

Também Maria da Conceição Fraga enaltece a postura de Francisco que “olha para as pessoas, não para o seu umbigo”.

“Ele pensa nos pobres. Isso é o que mais motiva admiração. Ele teve uma atenção e um carinho para as pessoas de Setúbal. A Basílica estava cheia até à porta e nós ficamos à frente de todos.

Saí de lá a pensar um pouco melhor”, explica esta senhora de 58 anos que começou por ser ajudada na cantina social e se deixou desafiar para o atelier musical.

Se o encontro com o Papa Francisco marcou quem lá esteve, a mudança de vida é operada pela relação que se cria entre utentes e funcionários.

“À medida que o tempo foi passando os utentes chegavam ao espaço de refeição e eles próprios já iam abraçar e cumprimentar a auxiliar. Já fazem esse movimento o que é extraordinário porque estamos a falar de pessoas que entravam de cabeça no chão e não a levantavam sem sair do espaço”, relembra a psicóloga.

Hoje olham de frente porque, assume Ana Gaspar, “foram validadas naquilo que são”.

A valência «Tornar a Ser», a par de outra resposta «Saber Viver Cada Dia» destinada a apoiar os doentes com Sida e as suas famílias, são propostas do Centro Social São Francisco Xavier, que efetivam o desafio do Papa Francisco para caminhar lado a lado com os mais pobres, numa “autodescoberta” de utentes e funcionários.

“A questão da verticalidade entre utente e doutor dissipa-se. Este é um grupo muito homogéneo, todos trabalhamos, decidimos, construímos em conjunto. A verticalidade dá lugar à horizontalidade que, na nossa opinião, é muito promotora de mudança em todos, inclusivamente em nós. Temos crescido imenso e feito muitas descobertas”, enfatiza Ana Gaspar.

A reportagem da Ecclesia assistiu ao atelier musical durante o ensaio para a atuação do grupo na celebração do Dia Mundial dos Pobres, marcado para amanhã, dia 19, em Lisboa.

LS



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