Nacional

Está de luto o mundo

D. Gilberto Reis
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Homilia do bispo de Setúbal, na missa por ocasião da morte de João Paulo II

Deus, nosso Pai, levou para junto de si o Papa João Paulo II, depois de 27 anos de serviço na cadeira de Pedro. Viemos dar-Lhe graças pela vida e serviço pastoral do Papa que nos deixa e viemos, como é normal, rezar por ele. Saúdo a todos e a todos agradeço o testemunho de carinho pelo Papa. João Paulo II foi um homem à estatura de Jesus Custo. À estatura de Jesus, na intimidade com Deus. Intimidade e confiança que enche os discursos, os livros, as celebrações. Em tudo nele se percebia esta relação vital com Jesus e n’Ele com o Pai e o Espírito Santo. Este homem era um verdadeiro crente. Impressionou-me a oração que fez no maior silêncio numa das vindas Fátima, o longo silêncio orante na missa numa das vezes em que concelebrei com ele na capela particular no Vaticano e, nesta Sexta-feira Santa, a oração da Via-Sacra a partir da sua capela. À estatura de Jesus, na sua maneira de ser e agir. Uni homem com autoridade: dizia e fazia. Um homem guiado pela verdade e que não agia em função das palmas ou das audiências. Um homem que dizia o que pensava sem medo nem mesmo dos atentados à vida. Um homem, coerente e convicto, com bom humor, alegria e esperança. Um filósofo, teólogo, artista, desportista. Um homem amigo. Um homem livre: livre diante de tudo e de todos para servir a Deus, no serviço do homem; livre para reconhecer os erros dos cristãos e pedir perdão; livre para condenar o totalitarismo comunista ou a globalização sem regras, que espezinha o homem. À estatura de Jesus, na relação com os homens. Amigo de cada homem. Defensor da vida humana e da vida de cada pessoa, defensor da dignidade humana e da liberdade, dos direitos humanos e dos direitos dos povos. Defensor do diálogo entre os cristãos e do diálogo entre todas as religiões. Por isso conquistou a estima de muito crentes de confissões diferentes, desde o Islamismo até ao judaísmo, como podemos observar na oração, tão bonita, com que acompanharam o Papa nesta hora derradeira! Um homem da comunhão entre os povos, do diálogo e da paz. À estatura de Jesus, no seu amor à Igreja. Um homem apaixonado pela Igreja, pela nova evangelização, pela santidade, pela Eucaristia, pela pastoral da juventude a quem atraiu. Um homem contemplativo como S. João e activo como S. Paulo. Um homem e um Papa à estatura de Jesus que deixa marcas de esperança na nossa história. Agradecemo-lo a Deus e rezamos por ele. Está de luto a Polónia. Está de luto a Igreja católica. Está de luto o mundo. Há muito se percebia que João Paulo II era de todos. E a prova disto, se era precisa, são-no as mensagens de apreço vindas de toda a parte, do povo simples e dos homens mais ilustres, independentemente das suas convicções religiosas e são-no ainda as reportagens que os media dão ao acontecimento O Santo Padre partiu para o céu, assim o esperamos e pedimos. O céu é a pátria do homem. É lá que o Pai nos aguarda, para nos fazer transbordar da sua vida, alegria e paz como o próprio Jesus no-lo ensina com a aparição aos seus discípulos neste II domingo pascal. Temos saudade do Papa que Deus nos deu e nos tirou, mas não o perdemos. Continuamos em comunhão. Por um lado, porque nos levou a todos no coração e não cessa de rezar a Jesus por cada um de nós e, por outro lado, porque em cada um de nós há um pouco dele mesmo: uma palavra, um pensamento, um gesto, um sorriso. João Paulo II era um apaixonado pela virtude da misericórdia. Falara de Deus rico em misericórdia, tinha dito que a misericórdia faz parte da Igreja, tinha insistido na necessidade de a praticar e de a implorar do Céu, tinha instituído o II domingo da Páscoa como dia da misericórdia para ajudar a Igreja a crescer no amor de misericórdia. E Deus – que bonito! – veio buscá-lo neste dia tão significativo, para o introduzir no seio da Santíssima Trindade, onde poderá saborear, no grau mais elevado, a imensidade e a beleza da misericórdia divina. O Santo Padre partiu para o Pai, mas deixa-nos um grande legado. Sejamos dignos deste grande legado e perguntemo-nos sobre aquilo que precisamos de fazer para que esse legado se realize plenamente na nossa vida, no mundo onde estamos e, aqui, concretamente Nesta Eucaristia, em clima de acção de graças, pedimos a Nossa Senhora de quem o Santo Padre era profundamente devoto (e por causa disso devoto especial de Fátima) que, acompanhada pelos anjos, o apresente a Jesus Cristo, seu e nosso Redentor, e por Cristo seja introduzido na vida, no amor, na alegria, na festa da Santíssima Trindade. Amem. Sé de Setúbal, 3 de Abril de 2005 † Gilberto, Bispo de Setúbal


João Paulo II