Parece-me não ferir muito os princípios da Teologia da vida religiosa, se disser que um Capítulo Geral ou Provincial, na vida de qualquer instituto ou Congregação religiosa é um autêntico “Sacramento”. Sacramento para a congregação que o celebra, e Sacramento para as Irmãs que nele participam ou comungam.
Com efeito, que forma mais peculiar de Deus se comunicar a um grupo de discípulos de Jesus, que se reúnem em Seu nome e ao Seu redor, convocados pelo Seu Espírito para, juntos, procurarem e discernirem a Vontade de Deus e dos homens contemporâneos, a fim de que, quais samaritanos, não passem à frente sem antes se debruçarem e “unguentarem” tanta chaga viva, tanto homem reduzido a corpo sofredor, tanta pessoa sem nome, dignidade, desprezada ou ignorada de todos.
Foi isto que acabou de realizar, em Torres Novas, de 8 a 28 de Agosto, a Província Portuguesa da Congregação de S. José de Cluny.
E como sempre acontece, o Capítulo teve, podemos dizê-lo, usando a feliz expressão do querido Padre João Pedro Cubero, duas partes: o “Capítulo rezado” (retiro espiritual de 8 dias orientado pelo Padre Mário Garcia, S.J.) e o “Capítulo dialogado”, de 19 a 28.
Quem activamente participou neste grande acontecimento de Igreja, decerto terá dificuldade em destrinçar qual ou quais os momentos mais significativos e decisivos para a vida da nossa Província: se os momentos altos de celebração espiritual e fraterna, com uma profusão de gestos e símbolos duma riqueza inaudita, se os momentos de busca intensa, quase ansiosa mesmo (não fora uma palavra ou sentimento fora do dicionário do Espírito Santo) de procurar apresentar propostas de caminhos “transitáveis” para chegarmos, com audácia e urgência, à estalagem mais próxima, onde o calor do acolhimento e a doçura do amor fraterno são o novo bálsamo de qualquer viandante abatido e só.
E mesmo dentro das nossas comunidades, pode haver muito gesto de sacerdote ou levita, pensando dar mais glória a Deus com Liturgias solenes e Projectos ou Planos Pastorais a implementar, do que despindo o manto do orgulho, tomar o avental do serviço, derramando água fresca na bacia dum coração misericordioso e cheio de ternura, e limpar, no silêncio e na compaixão, as marcas que os caminhos do desencontro deixaram tão gravadas.
E para que todas sentíssemos que só há verdadeira regeneração, quando ecoa em nós o grito lancinante de Cristo encarnado: “...a fim de que todos tenham vida...”, este “slogan” estava marcado e espalhado da recepção, à Sala Capitular, do Ícone comemorativo à mesa da Palavra de Deus. Tudo nos convidou, neste verão de seca e incêndios, a não deixar extinguir em nós a nascente que, brotando do lado de Cristo, sacia e renova todas as coisas. Que o Espírito de Deus, que desde o início paira sobre as águas, desça sobre todo o trabalho realizado e dê, aos nossos corações e aos nossos pés, o dinamismo audacioso dos primórdios do nosso Instituto e nos leve a dizer com Ana Maria Javouhey, nossa fundadora: “com uma vontade forte fazem-se grandes coisas”.
Agradecemos à nossa Superiora Provincial, Irmã Matilde Faneca e ao seu conselho, a riqueza que nos proporcionaram e o entusiasmo que nos transmitiram. Que na preparação do bicentenário da fundação da Congregação que se aproxima, nós tomemos consciência do valioso património espiritual que possuímos e que não descansemos, enquanto não alargarmos as cordas da nossa tenda Cluny para poder partilhar, com Associados e Jovens, um Carisma tão rico e actual para o nosso tempo.
Uma Irmã capitular