Luto pede presença, escuta e afeto
Especialistas dizem que reações inesperadas de raiva e desespero perante a perda devem ser entendidas
Lisboa, 31 out 2011 (Ecclesia) – A presença, o afeto e a aceitação de comportamentos inesperados de revolta e agressividade por parte de quem perde pessoas queridas são mais importantes do que palavras de circunstância, consideram dois peritos no luto ouvidos pela ECCLESIA.
A primeira regra do acompanhamento é “estar disponível” e prestar-se a ouvir, dado que “o problema essencial” é a “obsessão” pela pessoa que morreu, falando-se insistentemente dela “com o único objetivo de a manter viva”, explica José Eduardo Rebelo, fundador da “Apelo”, associação de apoio ao luto.
O padre José Cristino, capelão do Hospital de Santa Marta, também sublinha a importância de “não falar em demasia”, evitando frases feitas como “tinha de acontecer”, “a vida é assim” e “Deus lá está”.
“O mais importante é saber escutar” porque “o silêncio, por vezes, fala mais do que as palavras”, nota o sacerdote, que destaca o valor dos afetos, como “abraçar a pessoa e mostrar-lhe solidariedade”: “‘Conforto’ e ‘consolação’ são palavras-chave no luto”.
Na entrevista que vai hoje para o ar pelas 18h00 na RTP-2, os especialistas salientam a necessidade de “não censurar os atos” de agressividade ou desespero da pessoa enlutada, mesmo que estejam fora dos seus comportamentos habituais.
“Por mais complicadas que sejam as reações, como a raiva contra Deus, contra si próprio, contra o guia espiritual ou contra a pessoa que cometeu o crime, não as devemos censurar, porque é um processo transitório”, refere José Eduardo Rebelo.
“Depois de nos enraivecermos e passarmos por todas as fases anómalas em relação ao que conhecemos de nós, assumimos a perda e começamos a reorganizar-nos emocionalmente, partindo para novas vinculações, que são o essencial na vida”, acrescenta o fundador da Sociedade Portuguesa de Estudo e Intervenção do Luto.
José Eduardo Rebelo, que perdeu a mulher grávida e os filhos num acidente de viação, afirma que “a maior parte dos lutos são saudáveis, mesmo que prolongados”, servindo para restabelecer o equilíbrio emocional.
A Igreja, por seu lado, encontra um “grande problema” no acompanhamento antes e depois das exéquias, pelo que é preciso criar “grupos de apoio que visitem as pessoas enlutadas e as ajudem a superar a solidão”: “Por vezes limitamos o luto ao momento da despedida do corpo”, diz o padre José Cristino.
O sacerdote frisa que a Igreja tem de “aproveitar melhor as oportunidades” das missas de sufrágio e salienta que as liturgias associadas à morte devem ser “marcantes”, “afetivas” e com homilias bem preparadas.
Esta terça-feira os católicos assinalam o dia de Todos os Santos, feriado nacional aproveitado por muitos para rumarem aos cemitérios, e na quarta-feira evocam os Fiéis Defuntos.
“A 1 de novembro faz-se a grande exaltação daqueles e daquelas que a Igreja não declarou canonicamente santos mas estão, de certeza, junto de Deus para sempre. São tantos que não têm conta”, aponta o capelão.
Depois de uma “festa muito bonita, de esperança, de alegria e do acreditar que esta vida é uma passagem”, segue-se um dia “mais triste”, em que os fiéis lembram os que lhe foram próximos e “estão a caminho da purificação total e da vida plena com Deus”.
O programa ECCLESIA na Antena 1 transmite esta segunda e quarta-feira, a partir das 22h45, excertos destas entrevistas.
PTE/RJM
Morte