Em nada melhorou, nos últimos dias, o clima de tensão social que este ano se respira em Itália, com especial incidência em Roma, neste período natalício, e de que aqui se falava na semana passada. Pode-se mesmo dizer que a situação tem vindo a agravar-se perigosamente, correndo o risco de tornar-se incontrolável. Referimo-nos antes de mais às greves selvagens no sector dos transportes públicos, que se vêm multiplicando por todo o país, afectando sobretudo as grandes cidades. A maioria dos trabalhadores recusa-se a seguir as cúpulas dos respectivos sindicatos, rejeitando por maioria de razão a obediência às autoridades.
Desrespeitam-se acordos de estabilidade e de concertação social pacientemente tecidos em meados dos anos 90 e que até agora raramente eram violados. Normas que se tinham traduzido em leis do Estado, impondo que se assegure sempre um mínimo de serviços essenciais e estabelecendo um período de tréguas nas épocas festivas. Nos transportes públicos, por exemplo, as greves têm que ser anunciadas com antecedência, garantindo pelo menos seis horas de funcionamento, nas horas de ponta dos dias de semana. Por outro lado, as greves são fora de lei durante todo o período de Natal e Ano Novo.
Tudo isto foi repetidamente ignorado nos últimos dias, em diversas cidades italianas, para grande irritação não só das autoridades e dos responsáveis sindicalistas, mas também do cidadão comum. No mesmo momento em que, sábado à tarde, os dirigentes das três centrais sindicais assinavam, em Roma, o novo contrato de trabalho estava em curso uma greve selvagem. A notícia do acordo alcançado (que hoje em dia se difunde em tempo real através de telemóveis e mini-rádios), em vez de levar à suspensão desta forma colectiva de protesto, teve o efeito oposto: o metro interrompeu completamente o serviço e a quase totalidade dos autocarros e eléctricos recolheram a meio da tarde aos depósitos, deixando largos milhares de pessoas a pé e ao frio, nas paragens, sem perceber o que se estava a passar.
Uma história que se repetiu, em Roma, domingo de manhã, da parte de uns 50 % dos autocarros, não obstante o governador civil tivesse oficialmente decidido a “requisição” compulsiva de todos os condutores com turnos neste dia. O mesmo tinha acontecido, há poucos dias, em Turim e em Génova, e antes ainda em Milão. Mesmo num país como a Itália, onde ninguém põe em causa o direito de greve, factos deste tipo causam profundo mal-estar e uma sensação de insegurança e de tensão, sem saber aonde se irá parar. Ultrapassados os sindicatos tradicionais, desrespeitadas as normas da convivência colectiva, tem-se a impressão de estar perante uma nova forma de terrorismo, provocando um clima colectivo de medo.
Para além dos transportes públicos locais, também os voos foram gravemente afectados, na semana passada, em Roma, onde, por duas vezes, inesperadamente, milhares de trabalhadores da Alitalia bloquearam a auto-estrada de acesso ao aeroporto de Fiumicino, obrigando a cancelar dezenas de voos. A polícia carregou sobre os manifestantes, mais não conseguindo do que exasperar ulteriormente a situação.
Pacheco Gonçalves,
Voz Portucalense