Nacional

Religiosos portugueses pedem verdade para Moçambique

Octávio Carmo
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Comissão Justiça e Paz da CNIR/FNIRF diz que o Governo deve exercer pressão junto da comunidade internacional. Comunicado não deixa dúvidas em relação ao tráfico de seres humanos

A Comissão Justiça e Paz dos Institutos Religiosos masculinos e femininos de Portugal (CNIR/FNIRF) acaba de publicar um documento sobre os tráficos de órgãos e crianças em Nampula, Moçambique, onde exige aos governantes do nosso país que “exerçam pressão internacional para que a verdade não seja ocultada e a justiça seja realizada”. O Pe. Valentim Gonçalves, Presidente da Comissão, explica à Agência ECCLESIA que o comunicado “é uma manifestação de solidariedade e de apoio aos que, testemunhas directas ou indirectas dos acontecimentos, os denunciam e exigem o seu esclarecimento”. A Comissão tomou esta posição depois de dois encontros alargados com missionários que trabalharam em Moçambique ou pertencentes a institutos que lá trabalham. O Pe. Valentim Gonçalves, missionário do Verbo Divino, já revelara à Agência ECCLESIA que os religiosos e religiosas de Portugal estavam “a recolher informação para procurar entender o que se passa, na medida em que é possível entender”. Contrariando as teses oficiais do poder em Moçambique, os religiosos revelam que possuem informações, vindas de missionários e de grupos eclesiais como a Comissão Diocesana de Justiça e Paz, de que em Nampula têm desaparecido crianças, jovens, adolescentes e também alguns adultos. “Foram encontrados vários corpos mutilados e enterrados sem qualquer processo de identificação”, asseguram. Apesar de o debate se ter centrado no problema do tráfico de órgãos e de os religiosos não descartarem essa possibilidade, o comunicado alerta que “focalizar as atenções nesse aspecto é reduzir o campo de análise do problema”. “A grande questão diz respeito ao próprio tráfico de seres humanos, que pode ter muitos fins, entre os quais a exploração sexual, o trabalho escravo e o tráfico de órgãos”, afirmam. O texto desta comissão lembra que muitos jornalistas estiveram nos locais e puderam mostrar que havia situações a justificarem grande suspeita no que se refere ao tráfico de crianças e jovens. Os missionários no local asseguram que “há fenómenos e acontecimentos que, depois de se ter denunciado o problema, sofreram alterações”, deixando assim a exigência de um esclarecimento desses fenómenos estranhos. Falando para os seus colegas em Moçambique, os religiosos e religiosas dizem que “queremos manifestar o nosso apoio e a nossa solidariedade aos nossos irmãos e irmãs que denunciam os factos horrorosos que se têm deparado diante dos seus olhos ou de cuja existência lhes chegaram testemunhos directos ou indirectos, mas de qualquer modo suficientes para justificarem a denúncia daquilo que ainda mais vem agravar a já muito fragilizada situação do povo moçambicano, envolvido no medo nascido de factores tão diversos como crenças e costumes ancestrais até à falta de confiança nas instituições públicas”. Os Institutos religiosos de Portugal fazem questão de alertar que “se a globalização funciona como uma rede, no que diz respeito aos mafiosos e traficantes essa rede não tem limites”. “A investigação imparcial, séria, competente e célere será o meio adequado e necessário para ir quebrando os elos de uma cadeia que mantém as populações mais pobres em condições que nada têm a ver com a dignidade e com a liberdade”, concluem. Os casos em questão foram tornados públicos no dia 13 de Setembro de 2003, numa denúncia assinada pelo Arcebispo de Nampula, D. Tomé Makhweliha, pelo Reitor do Seminário Inter-diocesano, Pe. Carlos Alberto Gaspar Pereira, pela leiga consagrada da Arquidiocese de São Paulo, Maria Elilda dos Santos, e pela superiora do Mosteiro Mater Dei, Ir. Maria Cármen Calvo Ariño (Ir. Juliana). Essa denúncia foi levada à reunião da Conferência Episcopal de Moçambique, que decidiu apresentar o problema ao Presidente da República, Joaquim Chissano. A hierarquia da Igreja Católica em Nampula tem-se mostrado solidária com as missionárias que denunciaram a existência de tráfico de órgãos humanos na região e já repudiou notícias que "desprestigiam" essas denúncias. A Agência ECCLESIA sabe, contudo, que estes casos já eram comentados há alguns anos por missionários e voluntários portugueses que trabalharam em Moçambique, sendo que só agora se começam a aperceber da dimensão dos fenómenos que observavam. O documento • Tráficos em Moçambique Todas as notícias • Moçambique


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