Profundamente cristão, o filósofo Paul Ricoeur publicou a sua última obra "L»Hermenéutique biblique" em 2001. Emmanuel Mounier, Gabriel Marcel, Gadamer e Emmanuel Levinas estavam entre os seus principais amigos. Admirado e respeitado em todo o mundo, centrou o seu pensamento na dignidade da pessoa.
É considerado um dos maiores filósofos europeus de todos os tempos. Morreu há pouco mais de uma semana (21 de Maio de 2005) aos 92 anos de idade. Mas deixou uma obra singular, um pensamento escrito para a eternidade, fundado em sérios e profundos alicerces da sabedoria e da religião.
Natural de Valence (França), cedo ficou órfão e, juntamente com a sua única irmã, foi educado pelos avós paternos, cristãos. Após os estudos liceais, em que se destacou sempre como excelente aluno, formou -se em Filosofia e em Letras. Prisioneiro dos nazis durante a II Guerra Mundial. Mais tarde, com a libertação, trabalhou para o Centro Nacional de Pesquisa Científica , antes de tornar-se professor de História da Filosofia na Faculdade de Letras de Estrasburgo e na célebre universidade de Sorbonne, em Paris.
Paul Ricoeur foi ainda Catedrático da Universidade de Nanterre; e passou pelas Universidades de Lovaina, na Bélgica, em Chicago e em Yale, nos Estados Unidos. Conferêncista solicitado para grandes debates sobre a linguística, a psicanálise ou a hermenêutica, manifestou um interesse particular pelos textos sagrados do cristianismo.
Fez parte da famosa revista Esprit, fundada por Mounier, conhecido como o “pai” do personalismo. No congresso internacional sobre este filósofo, no centenário do seu nascimento ( Abril de 1905), que aconteceu em Janeiro deste ano na Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, Ricoeur alertou para os perigos resultantes da recusa pelo “carácter moral dos laços sociais»; quando isso ocorre, afirmou, desencadeia-se «a luta pelo reconhecimento recíproco», na qual prevalecem comportamentos negativos como a «humilhação, o desprezo, a violência em todas suas formas físicas e psicológicas» e a discriminação das minorias”. Para evitar estas ameaças, Ricouer propôs “a criação de laços políticos que façam dos homens cidadãos de uma comunidade que não se baseia nas lógicas do mercado, «mas na gratuidade do dom, pois a doação continua a ser um gesto espontâneo que não se subordina a cálculos interesseiros».
Distinguido com o Grande Prémio de Filosofia da Academia Francesa, Ricoeur foi também galardoado em 2004 com o prestigiado Prémio John W. Kluge, uma distinção americana no campo das ciências humanas. E, em 2003, com o Prémio Paulo VI, concedido de cinco em cinco anos pelo Instituto Paulo VI de Brescia, a importantes personalidades ou entidades que tenham contribuído para o progresso da cultura de inspiração religiosa, como já acontecera antes com o teólogo H. Urs von Balthasar e o exegeta Oscar Cullmann. Na cerimónia da atribuição deste Prémio, no Vaticano, o Papa João Paulo II reconheceu Paul Ricoeur como um dos maiores pensadores contemporâneos, e “um homem de fé, empenhado na defesa dos valores humanos e cristãos”, conhecido também “pela generosa contribuição no diálogo ecuménico.
A sua investigação realça a fecundidade da relação entre a filosofia e a teologia, entre a fé e a cultura; trata-se de uma contribuição que, como desejei recordar na Carta Encíclica Fides et ratio, deve realizar-se sob o sinal da circularidade” sublinhou então João Paulo II.