Segundo um relatório das Nações Unidas, nos últimos dez anos, morreram nas guerras dois milhões de crianças e quatro milhões ficaram gravemente mutilados. São números alarmantes que demonstram uma autêntica “matança de inocentes”, mesmo quando essas vítimas são obrigadas a tornar-se carrascos.
No dia 1 de Junho celebra-se o Dia Mundial da Criança. Um estudo da agência missionária Fides (www.fides.org), do Vaticano, apresenta um conjunto de dados sobre a situação actual da infância a nível mundial.
Crianças-soldado
São as crianças-soldado que combatem em três quartos dos conflitos no mundo. São mais de 300 mil jovens entre os sete e 17 anos que estão actualmente empenhados em 36 conflitos sangrentos, 12 dos quais se travam na África.
É uma experiência de morte que as crianças realizam por causa de adultos sem escrúpulos, que as recrutam com violência e chantagem para viver experiências traumatizantes.
Muitas dessas histórias começam depois de as crianças terem ficado órfãs por causa da guerra. Outras vezes, são sequestradas dentro das suas famílias, são recrutadas na estrada ou ameaçadas.
Muitas vezes são castigadas, ameaçadas de morte, drogadas, obrigadas a transformarem-se em delatores, levadas a cometer acções de violência contra pessoas da sua própria aldeia para que não oponham resistência aos chefes desses minis exércitos fora da lei.
Também são “crianças em guerra” as que são utilizadas para o trabalho brutal e desumano de abrir percursos seguros em zonas minadas. Caminhando à frente das tropas, as crianças eliminam, com sua própria morte, o perigo para quem vem atrás. Uma mina a menos significa uma criança morta ou, no melhor dos casos — por assim dizer —, mutilada para sempre.
Segundo um relatório das Nações Unidas, nos últimos dez anos, morreram nas guerras dois milhões de crianças e quatro milhões ficaram gravemente mutilados.
São números alarmantes que demonstram uma autêntica “matança de inocentes”, mesmo quando essas vítimas são obrigadas a tornar-se carrascos.
O facto de uma criança aprender a manusear com agilidade uma arma leve, tornar-se um assassino e habituar-se a uma vida de guerrilheiro, não acaba em nenhum modo com as responsabilidades morais dos adultos que a obrigaram a levar este tipo de vida, acabando com qualquer possibilidade de uma futura reinserção na sociedade da qual foi retirada.
Diante deste fenómeno que, segundo os especialistas militares, não tende a diminuir, mas que parece destinado a aumentar nos próximos anos, a ONU e muitas organizações de defesa dos direitos do homem estão a mobilizar-se para impor sanções, também de ordem comercial, aos países que não respeitem as convenções internacionais de defesa dos direitos e da dignidade da infância (a partir da Convenção dos Direitos da Infância de 1989).
Mesmo que em diversos países seja proibido que uma criança combata antes dos 15 anos de idade, muitas associações humanitárias lutam para que o limite de idade passe a ser, pelo menos, de 18 anos. De facto, isto significaria, não apenas a protecção para um número muito mais alto de menores, mas bloquearia a proliferação de armas leves e advertia os países envolvidos no dramático problema das crianças-soldado.
Os recentes episódios de terrorismo internacional deixam entrever a “transversalidade” da presença dos menores em acções violentas; um fenómeno que não diz respeito somente a cada uma das nações, mas principalmente a situações de violência que se inserem em projecto global, com bases operacionais locais, nas quais também são utilizados menores.
Facto que confirma a consolidada certeza de que a violência não tem bandeiras, mas somente uma única cor: a cor do sangue.
Colômbia, Myanmar, Sri Lanka, Afeganistão, Somália, Burundi e República Democrática do Congo utilizam 150 mil crianças-soldado. Mas o problema está muito mais difundido e, segundo algumas fontes, diz respeito a três quartos das guerras actualmente em curso no planeta.
Fome
Oitocentos milhões de pessoas no mundo são cronicamente subalimentadas e, cada noite, 200 milhões de crianças com menos de cinco anos vão dormir com o estômago faminto. Este número aumenta durante os períodos de escassez alimentar e em tempos de penúria ou desordens sociais.
Segundo algumas estimativas, a malnutrição é um factor determinante para a morte de 13 milhões de crianças que não chegam aos cinco anos de idade. Em 25 países do mundo, mais de 15 por cento das crianças morrem antes de chegarem aos cinco anos de idade.
As causas principais desta terrível “matança de inocentes” são: a diarreia, o sarampo, o tétano, a pneumonia. Ao fim e ao cabo, doenças curáveis com remédios genéricos, de baixo custo!…
Mas quando faltam as formas mais elementares de higiene, que esperança há para estes pequenos? De facto, continua alta também a mortalidade neonatal em muitos países do Sul do mundo; e calcula-se que cerca de 20 milhões de crianças morrem anualmente pouco antes do nascimento, por malnutrição da mãe durante a gravidez.
Sida
São as crianças e os adolescentes as maiores vítimas da Sida: só no ano2000, pelo menos 600 mil crianças com menos de 14 anos contraíram o vírus do HIV; e, em 2002, mais de 4,3 milhões de pessoas morreram de Sida. Este número — diz a Unicef — inclui meio milhão de crianças.
As crianças infectadas são cerca de um milhão e meio, enquanto que dez milhões de adolescentes, pelo menos um terço dos atingidos pelo vírus, têm entre 15 e 20 anos de idade.
Cada dia, duas mil crianças menores de 15 anos tornam-se seropositivas; há muitas que já nascem doentes, contagiadas pela mãe durante a gravidez ou no momento do parto.
Nenhuma outra região no mundo foi atingida tão duramente como os países da África subsaariana, onde se encontram três quartos da população doente. Também é alto o número de órfãos da Sida: cerca de 13 milhões, dos quais mais de dez têm menos de 14 anos, e quase todos são africanos.
As projecções para 2010 são alarmantes: serão 20 milhões as crianças africanas com menos de 14 anos que terão perdido um dos pais ou mesmo os dois.
Educação negada
A educação é um direito fundamental. Mesmo assim, hoje no mundo, 121 milhões de crianças não gozam do direito a uma educação básica, porque nos seus países a escola ainda não é obrigatória, gratuita e acessível a todos.
São principalmente as meninas a pagarem o preço da falta de instrução, porque a maioria das exclusões refere-se ao sexo feminino: 65 milhões, enquanto os meninos são 56 milhões.
Mas estamos apenas perante números aproximados, uma vez que alguns países não são capazes de calcular a população escolar, já que não há registos, por circunstâncias ligadas à guerra, ou porque se trata de crianças que vivem em estado de abandono.
Outra causa da falta de escolarização das crianças é o mercado do trabalho infantil, que recruta, a baixo custo, pequenos operários que com baixos salários, mantêm toda a família.
Outras vezes, trata-se de meninas vítimas de tráfico e exploração, ou empregadas em suas próprias casas, na assistência a seus pequenos irmãos, ou anciãos e doentes.
Tráfico
Em cada ano, no mundo, mais de um milhão de crianças são vítimas do tráfico de seres humanos. O relatório do Unicef “Stop the traffic” evidencia o fenómeno dos criminosos da exploração infantil, que promovem a transferência dos menores dos países em desenvolvimento (África Central e Ocidental e sudeste asiático) para as regiões de bem--estar dos países ocidentais.
São os escravos do novo milénio e são explorados pela indústria do sexo, como mão-de-obra de baixo custo ou como domésticos. As mais felizes podem ser adoptadas, mas não faltam os casos de menores que desaparecem misteriosamente e são assassinados para fornecer órgãos para transplante através de canais ilegais.
O capítulo da “exploração sexual” é um dos mais dolorosos. A exploração sexual com fins lucrativos tem muitas facetas. Na Tailândia, um estudo sobre a economia ilegal revelou que, de 1993 a 1995, a prostituição representou cerca de dez a 14 por cento do Produto Interno Bruto e calcula-se que cerca de um terço das mulheres tailandesas envolvidas no mercado da prostituição seja menores de idade.
A convenção dos Direitos da Infância, adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de Novembro de 1989, condena a exploração das crianças trabalhadoras por parte de adultos sem escrúpulos.