Não maltratarás nenhum órfão Elias Couto 28 de Julho de 2006, às 16:41 ... Intenção Geral do Papa para o mês de Agosto 1. Pobres entre os pobres. Na história da humanidade há linhas de continuidade que importa reter. No contexto da reflexão sugerida pela Intenção do Santo Padre, emerge uma dessas continuidades: as crianças órfãs caem muito mais facilmente em situações de pobreza e marginalidade do que aquelas a quem não falta o cuidado e protecção dos pais. Tais situações de pobreza e falta de protecção são quase sempre aproveitadas por adultos sem escrúpulos, capazes de explorar os mais débeis, por vezes das formas mais abjectas e desumanas – prostituição e outras violências sexuais, trabalho escravo, mendicidade, utilização em actos de terrorismo ou mesmo de guerra... Deixadas a si mesmas, as crianças órfãs são também, com frequência, utilizadas como correios para o transporte de drogas ou vÃtimas da violência de bandos marginais organizados. Compreende-se, por isso, que sociedades mais compassivas se preocupem em organizar instituições capazes de suprir, tanto quanto possÃvel, a ausência dos pais e de proporcionar aos órfãos os cuidados e protecção que lhes são devidos. Infelizmente, são muitos os casos em que nem o Estado nem a sociedade civil dispõem de meios para acorrer a todas as necessidades; e há também sociedades menos compassivas, nas quais os órfãos são, de facto, deixados à sua sorte e à mercê da lei do mais forte... 2. Não descurar a formação. Sociedades preocupadas com o próprio futuro não podem deixar de investir na educação das suas crianças. Esta tarefa é obrigação e direito dos pais, que devem poder contar com a colaboração de instituições da sociedade civil e do Estado. No caso dos órfãos, e não havendo outros familiares capazes de assumir a tarefa dos pais, restam as instituições, da sociedade civil ou do Estado, vocacionadas para o seu acolhimento, acompanhamento e formação. Destas, espera-se que assumam tal encargo como serviço prestado aos mais frágeis e desprotegidos da sociedade. Só com esta atitude será possÃvel levarem a bom termo uma tarefa tão meritória quanto difÃcil. É de esperar, também, que o Estado, mais do que criar instituições próprias, esteja disponÃvel para acolher e financiar as iniciativas da sociedade civil, quando estas apresentem garantias de idoneidade, competência e, sobretudo, vocação para a tarefa que se propõem. Convém insistir neste ponto: o Estado, porque quase sempre burocrático, distante e frio, não está vocacionado para assumir este tipo de tarefas; é seu dever deixar espaço para que possam brotar, a partir da sociedade civil e de instituições mais próximas das pessoas e dos seus problemas, iniciativas especÃficas, destinadas a servir os cidadãos – no caso presente, as crianças órfãs; é dever do Estado, também, uma vez que se financia com o contributo dos cidadãos, auxiliar financeiramente tais instituições, permitindo-lhes assim irem ao encontro das necessidades daqueles que nada têm; é ainda dever do Estado velar para que tais instituições cumpram normas básicas, de modo a não se afastarem da sua missão... 3. «Não maltratarás nenhuma viúva nem nenhum órfão...» (Ex 22, 21). Assim se exprime a BÃblia, em muitas passagens, ameaçando com pesados castigos quem oprimir os mais fracos e desprotegidos de entre o povo – sendo os órfãos e as viúvas o exemplo acabado desta situação de fraqueza. Tal exigência bÃblica encontrou resposta, ao longo dos séculos, nas inúmeras formas de serviço aos órfãos assumidas pela Igreja. Com deficiências? Certamente, sobretudo se tal acção é julgada à distância de séculos e com os critérios de hoje. Tais deficiências não impediram, no entanto, a Igreja de estar presente, socorrendo os órfãos quando mais ninguém se preocupava com eles – e cumprindo, também desta forma, o mandamento do amor a Deus e ao próximo que, nas palavras de Cristo, faz a sÃntese da Lei e dos Profetas. Hoje, a Igreja continua activa, procurando as melhores formas de socorrer os órfãos. Por vezes, encontra obstáculos onde menos seria de esperar. Tal, porém, não a impede de agir, aliviando o sofrimento de milhões de crianças em todo o mundo, particularmente em paÃses onde quase só ela se ocupa e preocupa com os mais pobres entre os pobres – como é o caso das crianças órfãs. Este facto, apesar de raramente reconhecido, torna bem manifesta a força de humanização própria do Evangelho e mostra como a fé em Jesus Cristo é capaz de suscitar uma compreensão profunda e atenta da dignidade humana e promove uma caridade activa, fonte de esperança para toda a humanidade. Elias Couto Bento XVI Share on Facebook Share on Twitter Share on Google+ ...