Vaticano

Relação com Angola deve ultrapassar economia, diz presidente da CEP

Lígia Silveira
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D. Jorge Ortiga acompanha viagem de Bento XVI e recorda trabalho dos missionários portugueses

D. Jorge Ortiga defende que os contactos políticos e civis entre Portugal e Angola não podem ser exclusivamente económicos. O Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa afirma que a ligação entre Portugal e Angola não é unidireccional. “Portugal não deve estar à espera do que pode receber de Angola, mas tem de perceber o que pode e deve dar”. Em declarações à Agência ECCLESIA, o Presidente da CEP sublinha que os interesses económicos podem ser um instrumento de enriquecimento da população, “mas tendo em conta a promoção do povo, sem exploração, corrupção e fraudes”. As relações entre os dois países “têm de ir mais longe”. D. Jorge Ortiga encontra-se em Luanda a acompanhar a visita que Bento XVI faz a Angola. O Presidente da CEP foi convidado da Santa Sé para estar presente em Luanda dadas as ligações históricas entre Portugal e África, em especial na evangelização do povo africano. O Presidente da CEP afirma que Portugal tem uma “responsabilidade histórica e se no passado em alguns momentos adormeceu, hoje não o pode fazer”. Também a Igreja portuguesa “tem de estar na primeira fila, continuando a trabalhar como o temos feito”, explica. “Mais do que nunca a ligação entre Portugal e Angola faz sentido hoje. Deveria até ser intensificada. A educação, por exemplo, está, em muitos locais, na mão da Igreja, nas missões, quer nas cidades como também no interior”, sublinha D. Jorge que enaltece o trabalho das missões portuguesa que querem “dar dignidade ao povo”. “Em Portugal insistimos no voluntariado porque sabemos que há muitas pessoas com vontade de dar um tempo da sua vida na promoção de outras pessoas, seja na área da educação, da saúde, com disponibilidade para partir por um ou dois anos”. No entanto, D. Jorge foca as dificuldades que as congregações religiosas sentem para conseguir um visto. “Esta é uma dificuldade que sentimos e trata-se de trabalho voluntário, gratuito, de promoção social. Esta dificuldade que sentimos tem sido impedimento para uma ajuda social mais concreta” D. Jorge Ortiga teve já oportunidade de estar com missionários portugueses e com congregações religiosas em Luanda. As dificuldades de mobilidade em Angola impedem viagens maiores. “Percebi que são todos bem vindos para trabalhar. Sejam leigos ou religiosos, o trabalho que fazem é muito importante. Nunca poderemos abafar o apelo ao voluntariado qualificado para ajudar as pessoas, que o fazem em nome da fé, para um desenvolvimento integral do povo angolano”. D. Jorge Ortiga acrescenta ainda que o voluntário “não é apenas um anunciador do Evangelho mas suscitador do que o Evangelho promove e opera”. Expectativa pela chegada do Papa Em Luanda desde Quinta-feira, D. Jorge Ortiga testemunha a grande expectativa e os últimos preparativos para a chegada de Bento XVI, agendada para esta manhã de Sexta-feira “Está a ser encarado como um grande acontecimento para a Igreja angolana como concretização do abraço do Papa ao continente africano. “Este é um continente com mil diferenças mas com uma profunda alma religiosa”, exprime. D. Jorge Ortiga afirma que as pessoas “esperam um sentido diferente à vida. Não apenas na relação com o transcendente mas num compromisso com o material”. “Respira-se a necessidade da promoção humana. Justiça é a palavra mais adequada para este momento. Uma justiça que envolva todos na dignidade que ainda tem carências”, explica o Presidente da CEP, sublinhando o compromisso essencial para quer da Igreja quer do mundo civil pois, “há ainda muito para fazer”. Bento XVI entregou nos Camarões o documento de trabalho do próximo Sínodo de Bispos africanos onde deixou duras críticas às multinacionais que “invadem” África para apropiar-se dos recursos naturais, deixando danos significativos no meio ambiente. Para D. Jorge Ortiga, Bento XVI “põe o dedo na ferida. Reconhece as inúmeras potencialidades deste continente, mas também a realidade da pobreza. O Papa aponta o dedo às multinacionais que são fruto da globalização que talvez se queiram aproveitar deste povo”. De qualquer forma, foca o Presidente da CEP, “o próprio povo precisa comprometer-se mais com o seu desenvolvimento pessoal, numa aposta mais consciente e responsável que produza melhores condições de vida. Esta é uma terra muito rica e é preciso que o povo a assuma”. D. Jorge Ortiga afirma que “a pobreza é impressionante. Choca”. Passeando pela cidade percebe-se que faltam condições a vários níveis. “Falta de alimentos, de habitações condignas”, são exemplos do ambiente em que as pessoas vivem. “As deslocações são muito difíceis, inclusivamente para as pessoas poderem trabalhar. Se assim não for, dificilmente o progresso poderá acontecer”. As conversas com os Bispos lusófonos oscilam entre a expectativa para receber Bento XVI e o trabalho que as Igrejas lusófonas desenvolvem em parcerias. Sobre a polémica em torno das declarações de Bento XVI sobre o uso do preservativo, D. Jorge Ortiga considera redutor analisar a viagem do Papa tendo em conta apenas essa declaração. “Corre-se o risco de se falar apenas dessa questão, quando na realidade o Papa vai trazer uma mensagem mais vasta, complexa, com desafios e interpelações. É redutor fixarmo-nos apenas numa frase que se diz, quando a Igreja tem uma missão mais vasta e a própria viagem do Papa tem outras motivações”.


Bento XVI - Angola e Camarões