As crianças continuam a desaparecer a um ritmo de duas por semana, acusam
Os religiosos e religiosas da família dos Servos de Maria, a trabalhar em Moçambique, estão a promover um abaixo-assinado com o objectivo de pressionar a comunidade internacional a intervir na investigação sobres os casos de tráfico de órgãos humanos a decorrer nesse território lusófono.
“As crianças continuam a desaparecer a um ritmo cada vez mais acelerado: desapareceram, em média, dois meninos por semana” lê-se no comunicado da secção internacional “Justiça e Paz” dos Servos de Maria, enviado à Agência ECCLESIA.
De acordo com este documento, a população de Nampula continua “aterrorizada” e não denuncia os desaparecimentos dos próprios filhos. “Muitos defendem que os funcionários da polícia local estão envolvidos no tráfico”, avançam.
Neste momento, a referência da população são as irmãs Servas de Maria, que anotam todas as denúncias e as apresentam à Procuradoria e ao Bispo local, “após averiguar a sua veracidade”.
A família religiosa dos Servos de Maria exige, com a ajuda de quem se quiser associar ao abaixo-assinado, “uma pressão internacional sobre o governo de Moçambique”, que proteja os que denunciam e “destrua o muro do medo”.
Uma equipa da Procuradoria Geral da República esteve na região de Nampula, mas ninguém foi acusado destes crimes. O chefe dos procuradores provinciais de Nampula admitiu que “há falta de meios” para investigar o alegado tráfico de órgãos no país.
Por seu lado, D. Januário Torgal Ferreira, presidente da secção portuguesa da Pax Christi, diz que, até aqui, as respostas das autoridades moçambicanas têm sido evasivas, pelo que pede a Portugal que exerça “alguma pressão” junto da comunidade internacional para que o caso seja desvendado.
PARLAMENTO EUROPEU
O Parlamento Europeu deve discutir, em Abril, o alegado caso de tráfico de órgãos humanos em Nampula, Moçambique. O debate está a ser impulsionado por dois eurodeputados portugueses, José Ribeiro e Castro, do Partido Popular, e Carlos Lage, do Partido Socialista.
No passado dia 8 de Março, durante o período dedicado a intervenções sobre questões políticas relevantes, o deputado José Ribeiro e Castro dirigiu-se ao Presidente e ao Plenário do Parlamento por forma a chamar a sua atenção para o grave problema de tráfico de órgãos humanos que, alegadamente, vem acontecendo em Moçambique e para a falta de informação segura sobre os factos que envolvem o desaparecimento de 50 a 100 pessoas, na sua maioria crianças e jovens.
Em Portugal, a secretária de Estado portuguesa dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Manuela Franco, manifestou disponibilidade para responder a um apelo da Conferência Episcopal Moçambicana, com o objectivo de ajudar as autoridades moçambicanas na investigação destes casos.
IGREJA NA LINHA DA FRENTE
As investigações começaram em torno de uma denúncia feita pelas missionárias de Nampula, posteriormente apoiada pelas Conferências dos Religiosos e Religiosas de Moçambique (CIRM-CONFEREMO).
Num documento dado a conhecer pela Agência ECCLESIA no início de Março, estas abordam as denúncias de tráfico de crianças e órgãos humanos em Nampula, confirmando a existência desta prática.
O documento de sete páginas refere que “é inegável a existência de uma rede de tráfico de órgãos a actuar na África do Sul, para ficarmos apenas na nossa vizinhança”.
O comunicado indica também o nome de um casal a agir em Nampula, que já tinha sido apontado pelos missionários no local.
Os religiosos denunciam um “estranho movimento nocturno de viaturas e aeronaves de pequeno porte, no aeroporto de Nampula, que tem limites com a propriedade do casal em questão e com o mosteiro Mater Dei”.
Para os oitos responsáveis católicos que assinam o documento, o Estado não está a fazer uma investigação séria sobre os casos que foram denunciados desde o dia 2 de Outubro de 2002, criticando “negação apressada, pura e simples das denúncias” e “a tentativa de desacreditar as denúncias e de modo particular uma das denunciantes, Maria Elilda dos Santos”.
“No dia 13 de Setembro de 2003, numa denúncia assinada pelo Arcebispo de Nampula, D. Tomé Makhweliha, pelo Reitor do Seminário Inter-diocesano, Pe. Carlos Alberto Gaspar Pereira, pela leiga consagrada da Arquidiocese de São Paulo, Maria Elilda dos Santos, e pela superiora do Mosteiro Mater Dei, Ir. Maria Cármen Calvo Ariño (Ir. Juliana), foram divulgados vários acontecimentos estranhos e preocupantes ocorridos na cidade de Nampula”, revelam.
“Essa denúncia foi levada à reunião da Conferência Episcopal de Moçambique, que decidiu apresentar o problema ao Presidente da República, Joaquim Chissano”. Acrescenta o comunicado, que traz em anexo o relato dos oito casos denunciados nessa carta do ano passado.
Para saber mais• Congregações religiosas não recuam na denuncia do tráfico de crianças e órgãos humanos em Nampula• Igreja Católica em Moçambique apresenta os casos que denunciou ao presidente Chissano