Vaticano

Santa Sé critica opções da ONU sobre a clonagem humana

Octávio Carmo
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Conheça a posição oficial católica

A Santa Sé manifestou a sua decepção pelo resultado da votação com a qual o Comité Legal da Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu adiar durante dois anos a proibição global de toda a clonagem humana. Na origem desta decisão estarão, para o observador permanente da Santa Sé na ONU, arcebispo Celestino Migliore, interesses económicos «não confessados». “Com este procedimento elimina-se praticamente a possibilidade de discutir uma questão fundamental, que faz parte do que é o debate do século XXI . Os interesses económicos e comerciais, nos bastidores, tiveram um grande peso”, acusa em entrevista à Radio Vaticano. O grupo de países que queria permitir a clonagem com o objectivo de produzir e eliminar embriões humanos como material de pesquisa (a clonagem terapêutica), ao ficar em minoria, preferiu adiar qualquer decisão, constata D. Migliore. No total 80 países votaram a favor de uma «moção de não acção» («no action»), que supõe o adiamento de qualquer decisão, enquanto 79 votaram contra e 15 países se abstiveram. O representante vaticano qualifica esta medida como «decepcionante», declarando que «o adiamento de dois anos significa aceitar que, durante esse tempo, continuaremos a ter um vazio jurídico internacional, pelo que as pesquisas nesta área continuarão a acontecer». Duas propostas estavam sobre a mesa: a Costa Rica propunha o uso das células estaminais adultas para as terapias de doenças incuráveis e a proibição total da clonagem de embriões humanos, ou seja, “tanto a proibição da clonagem reprodutiva como a terapêutica”, esclarece o representante católico; a posição franco-alemã propunha uma proibição da clonagem reprodutiva, mas deixava uma ou várias portas abertas à terapêutica. «A posição da proibição total tinha alcançado de 30 a 66 adesões. Os apoiantes da proibição parcial não tinham interesse em submeter à votação as duas resoluções, pelos que recorreram a uma moção de “no action” que foi votada e aprovada antes”, explica o arcebispo Migliore. Após a votação, considera, «terão de reiniciar-se os procedimentos» que levem a uma proibição global da clonagem, assegura. A POSIÇÃO OFICIAL DA SANTA SÉ 1. Deve ser proibida qualquer forma de clonagem de indivíduos humanos: quer seja entendida como produção ou como tentativa de produção de um embrião humano, através da introdução do núcleo de uma célula somática num ovócito, cujo núcleo tenha sido tirado; quer seja entendida como produção de embriões a partir de um embrião preexistente – independentemente da sua origem – através da separação artificial de uma ou mais das suas células. 2. A diferença entre clonagem reprodutiva e clonagem terapêutica está exclusivamente na finalidade da operação: de facto, trata-se sempre de produzir um embrião destinado à clonagem, (a) para o implantar num útero a fim de levar a termo a gravidez; (b) ou com vista a utilizá-lo para fins de investigação científica (por exemplo, para a produção de células estaminais), o que inevitavelmente causa a sua destruição. Por conseguinte, dado que a proibição total da clonagem humana é incontestável, pode-se fazer a hipótese da determinação de vários casos penais, segundo a sua finalidade e as circunstâncias dos actos condenados. 3. A eventual tentativa de produção de embriões quiméricos, que combinam material genético humano e animal, deve ser objecto de sanções penais particularmente severas. 4. A condenação penal da produção artificial de embriões e da clonagem humana deve incluir qualquer forma de comércio e de intercâmbio não comercial, a nível nacional ou internacional, de embriões produzidos através da clonagem ou de material proveniente dos mesmos. De igual modo, não se pode reconhecer qualquer tipo de direito de propriedade intelectual sobre conhecimentos ou tecnologias relativos à clonagem humana. 5. Pelo contrário, a Santa Sé não se opõe à produção de células estaminais a partir de sujeitos adultos, ou então mediante a utilização de meios que não implicam a destruição de embriões vivos, incluindo os crioconservados. Considera-se lícito também o uso de células, tecidos ou outros materiais biológicos tirados de embriões ou fetos mortos espontaneamente. 6. Por outro lado, a clonagem entendida não como produção de indivíduos, mas como simples multiplicação celular (sobretudo de células estaminais), em si mesma não apresenta qualquer objecção ética. 7. A clonagem animal ou vegetal é regida por outros parâmetros éticos e não se insere na matéria que aqui estamos a debater.


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