Vaticano

Sociedades abertas e anúncio do Evangelho

Elias Couto
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Intenção do Papa para o Apostolado de Oração, Julho

Que os cristãos saibam ter em conta a sensibilidade e a dignidade das pessoas, sem, contudo, ocultar a radicalidade da mensagem evangélica. 1. Democracia e cristianismo. As sociedades abertas dão provas da sua vitalidade na medida em que não se deixam dominar por modelos de pensamento único, sejam eles promovidos por partidos políticos, instituições civis, meios de comunicação... Para que a convivência social não se torne impossível convém, no entanto, que o encontro, muitas vezes polémico, entre diferentes concepções de homem e sociedade, potenciado pela democracia, se dê num contexto de respeito pelas pessoas. De facto, numa sociedade aberta, o insulto nunca é argumento válido, embora possa ser tremendamente eficaz na sociedade mediática. Relativamente à Igreja Católica, porém, nas nossas sociedades democráticas, as coisas vão tomando um caminho diferente. Não é raro encontrar, em textos de opinião ou em intervenções televisivas, expressões como «terrorismo da Igreja católica», «os ayatollah católicos»...; a propósito da eleição do novo Papa, comen-tadores dos mais diversos quadrantes apressaram-se a clamar contra «a extrema-direita no Vaticano», «o regresso da Inquisição», o «obscurantismo» no governo da Igreja Católica...; nos debates sobre valores, comportamentos e modos de vida em sociedade, as propostas da Igreja Católica são quase sempre apresentadas como «conservadoras», «fundamen-talistas», quando não «criminosas», em vez de serem discutidas em função dos seus méritos e fragilidades... Poderá ser o preço a pagar pela diferença que brota do Evangelho, mas é também sintoma de um totalitarismo laicista que põe em causa a convivência democrática. 2. Dar as razões da nossa esperança. S. Pedro recomendava aos cristãos que não temessem ameaças nem se deixassem perturbar; pelo contrário, «no íntimo do vosso coração, confessai Cristo como Senhor, sempre dispostos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça; com mansidão e respeito, mantendo limpa a consciência, de modo que os que caluniam a vossa boa conduta em Cristo seja confundidos, naquilo mesmo em que dizem mal de vós» (1 Ped 3, 15-16). Eis um modelo de comportamento cristão no contexto das sociedades abertas e plurais em que vivemos. Ao insulto responde-se com razões; à calúnia responde-se com uma boa conduta em Cristo; e a todo aquele que o pede, apresentam-se as razões da esperança cristã, respeitando sempre a dignidade e sensibilidade do interlocutor, para que tais razões não apareçam como arrogância, antes como humilde testemunho de Cristo, «caminho, verdade e vida» para o crente e para toda a humanidade. Tal não supõe, porém, nenhuma adaptação ao «espírito do mundo», antes exige que o Evangelho seja testemunhado em toda a sua radicalidade. É uma questão de honestidade com o interlocutor. Não presta bom serviço ao Evangelho nem aos irmãos aquele cristão que, na esperança de encontrar melhor acolhimento, relativiza a mensagem e privatiza a fé, escolhendo do Evangelho apenas o que conforta a sua sensibilidade de homem moderno. Nem ganhará o seu interlocutor para o seguimento de Cristo, em Igreja, nem se firmará na própria fé. 3. Oportunidades. Em sociedades abertas sadias – aquelas onde o Estado não se erige em grande educador do povo nem pretende impor modelos de sociedade, antes respeita e promove a liberdade e vitalidade da sociedade civil e suas instituições – os cristãos devem sentir-se particularmente felizes em anunciar Cristo e assumir a sua pertença à comunidade eclesial. Estas sociedades, competitivas e plurais, constituem oportunidades mais do que obstáculos. Saibam os cristãos e as Igrejas libertar-se de complexos relativos ao passado e aparecer em toda a frescura e jovialidade da mensagem evangélica, sem esconder a sua exigência e radicalidade, e encontrarão homens e mulheres com o coração disponível para acolher a Palavra. Elias Couto


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