A tragédia que assolou Moçambique, mas também o Malawi e o Zimbabué, tem despertado uma solidariedade imensa que testemunha o melhor dos valores do povo de português: empatia, generosidade, mobilização social e humana. Muitas instituições em Portugal e no estrangeiro têm sido exemplo de eficácia e organização, estando na linha da frente do apoio a um povo que sofre profundamente no corpo e na alma. A quanta dignidade temos assistido! A imprensa desempenha o seu papel de alertar consciências e de mostrar imagens pungentes que destroçam o nosso coração. O governo tem tomado as medidas necessárias para se pôr ao serviço da comunidade portuguesa em Moçambique, mas também dos moçambicanos que nos recebem. Temos sido verdadeiramente um povo irmão de Moçambique! Toda a sociedade civil se tem mobilizado nesta missão de Justiça e Paz.
É claro que há sempre profetas da desgraça negando o seu apoio porque «em Moçambique há corrupção» e «o meu dinheiro pode ser desviado»... Auto-centrados, colocamo-nos na posição confortável de não dar, de nos fecharmos ao desafio que Moçambique nos coloca. Talvez haja alguma coisa que é desviada – já há notícias sobre isso, infelizmente -, mas esse facto não nos parece ser razão para desistirmos. Assim o esperamos.
Na Reflexão divulgada no início da Quaresma a Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) refere-se à Mensagem de Quaresma do Papa Francisco insistindo que ainda estamos bem longe de cumprir a Declaração Universal dos Direitos Humanos em cada ser humano de per si. Cedemos, segundo Francisco, «à exploração da criação (pessoas e meio ambiente), movidos por aquela ganância insaciável que considera todo o desejo um direito e que, mais cedo ou mais tarde, acabará por destruir inclusive quem está dominado por ela». A CNJP insiste que «não há direitos sem responsabilidades e que a responsabilidade implica a atenção desvelada ao outro, a solidariedade, o movimento de apagamento da minha necessidade imediata para que o outro possa também usufruir da vida tal como eu usufruo».
Quando pensamos na situação desastrosa em Moçambique não podemos deixar de lembrar que somos todos responsáveis por aquilo que se passou: os desequilíbrios das condições climáticas, se atinge todos, atinge sobretudo os pobres, os mais fracos, os mais vulneráveis. Por isso faz sentido trazer aqui o princípio da “eco-justiça” global: as principais vítimas de danos e desastres ambientais são os pobres e moram em países periféricos. E isso não é mera “coincidência”: é fruto daquilo que todos nós provocamos com um egoísmo que nos limita, não querendo perder privilégios para que outros – e são milhões! – possam viver em condições mínimas de dignidade.
A Comissão Nacional Justiça e Paz apela a que, agora e sempre, ponhamos em prática o princípio da “eco-justiça”. Que os meios de comunicação (que podem ser bem voláteis desde que tenham outro assunto que “faz notícia” com impacto nas audiências) não se esqueçam de sensibilizar os seus destinatários para este princípio da “eco-justiça”. Que todas e todos nós, sociedade civil, nos empenhemos não apenas neste momento de solidariedade que jorra do nosso coração, mas nos empenhemos dia a dia, hora a hora, de um modo racional, planeado e sistematizado na construção de um mundo “eco-justo” para todos.
Ainda estamos a tempo e não podemos perder esta Esperança, vital para as novas gerações. Em tempo de Quaresma rezemos para que assim seja, solidários com Moçambique e com a Paixão e Morte de Cristo. Porque somos um povo de Ressuscitados.
Lisboa, 8 de abril de 2019
A Comissão Nacional Justiça e Paz