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Matrimónio |
1. O sacramento. O M. é o 7.º *sacramento, que o Cat. (1534-1535) inclui, com o da *Ordem, nos que estão “ao serviço da comunhão”, destinados especialmente à edificação do povo de Deus. J. C. restituiu o *casamento (V. família) à unidade e indissolubilidade originais (Mt 19,5-9; Mc 10,1-12; Lc 16,18; cf. Gn 1,27-28; 2,23-24) e elevou-o, quando contraído entre baptizados, à dignidade de sacramento, a que se dá o nome de Matrimónio (ou, na linguagem corrente, “casamento na Igreja” ou “casamento canónico”). Entre baptizados não pode haver casamento válido que não seja sacramento (CDC 1055). O M. resulta do contrato legitimamente contraído e manifestado entre um homem e uma mulher, que mutuamente se entregam por toda a vida para viverem matrimonialmente. Os ministros do M. são os próprios contraentes (o sacerdote ou diácono que preside ao acto é testemunha qualificada da parte da Igreja). Na terminologia escolástica, a “matéria” do M. é o contrato matrimonial e a “forma” é a mútua aceitação (o duplo “sim”). O M. é o sinal eficaz do amor esponsal de Cristo com a Igreja e garantia das graças necessárias à vida matrimonial dos cônjuges. Por isso S. Paulo (Ef 5,21-33) o declara “grande sacramento” e tira desse amor esponsal a inspiração para o relacionamento dos cônjuges entre si e com a prole, vivido à maneira de testemunho (Cat. 1601-1617; Preliminares do “Ritual do Matrimónio”, 1-11). 2. Particularidades canónicas. (CDC 1058-1062). Podem contrair M. todos os que não estejam proibidos pelo direito (V. adiante impedimentos). O M., desde que pelo menos uma das partes seja católica, rege-se pelo direito divino e canónico. Quanto aos efeitos meramente civis, respeitam-se as leis vigentes do país. O M. goza do favor do direito, pelo que no caso de dúvida se fica pela sua validade, até que se prove o contrário e a nulidade seja formalmente declarada em juízo. O M. válido diz-se simplesmente “rato”, enquanto não for consumado (caso, p.ex., de quando é celebrado por procuração, permanecendo os cônjuges distantes um do outro). Presume-se “rato e consumado”, depois dos cônjuges coabitarem (a menos que se prove o contrário). O M. inválido diz-se “putativo” quando celebrado de boa fé ao menos por uma das partes, até que ambas se certifiquem da sua nulidade. São casos especiais: o Matrimónio misto, entre uma parte católica e outra de confissão cristã separada (1124-1129), o celebrado entre uma pessoa baptizada e outra não baptizada (1086) e a celebração secreta do Matrimónio (1130-1133), casos que implicam a autorização do Ordinário (CDC 1130-1133). Dependem ainda de autorização do Ordinário o M. de vagos, o que não possa ser contraído ou transcrito civilmente, o de quem tiver incorrido em pena canónica, o contraído por procurador, etc. (1071-1072). Os “esponsais” (promessa de casamento) regem-se pelo direito particular (que entre nós não existe), não dando direito à celebração do M., mas a eventual reparação de danos (1062). 3. Impedimentos. O novo CDC suprimiu os chamados i. “impedientes” ou “proibentes”, que obstavam à lícita celebração do M., sem o invalidar. Permanecem os chamados “dirimentes”, que tornam inábil a pessoa para o M. Pertence unicamente à Santa Sé legislar sobre a matéria e declarar quais são os i. de direito divino. Os i. de direito natural-divino não são passíveis de dispensa; dos restantes, há três cuja dispensa é reservada à Santa Sé; e dos outros pode o Ordinário dispensar. Em caso de artigo de morte, o Ordinário pode dispensar os súbditos de todos os i. de direito eclesiástico, com excepção do abaixo referido em A-a, bem como da forma canónica. Na mesma circunstância o ministro sagrado pode dispensar dos mesmos, se não lhe for possível recorrer ao Ordinário. A) Impedimentos não dispensáveis: a) consanguinidade em linha recta ou em 2.º grau de linha colateral (1078,3; 1091); b) impotência antecedente e perpétua para o acto conjugal (1084) (a esterilidade não é i., mas pode invalidar o M. se tiver sido dolosamente ocultada, 1084,3; 1098); c) vínculo ou ligame de M. anterior, mesmo que não consumado, ou, no caso de nulidade ou dissolução do vínculo (V. abaixo), antes da legítima declaração (1085). B) Impedimentos com dispensa reservada à Santa Sé: (1078,2): a) ordem sacra, sacerdotal ou diaconal (1087); b) voto perpétuo de castidade em inst. religioso de CDC pontifício (1088); c) crime (1090), i.e., causando a morte do cônjuge próprio ou do cônjuge da pessoa com quem se intenta casar. C) Impedimentos de que o Ordinário pode dispensar: a) idade (1083), inferior a l6 anos para o homem e 14 para a mulher (em Portugal, 16, por Decreto XIII da CEP, 25.3.1985); b) disparidade de culto (1086), entre parte católica e parte não baptizada; c) rapto (1089), obstando ao M. do homem com a mulher raptada ou retida na intenção de casar com ela, enquanto ela não manifestar livremente o seu consentimento; d) consanguinidade até ao 4.º grau da linha colateral, fora dos casos referidos em A-a (1091); e) afinidade em linha recta; f) pública honestidade (1093), entre homem e consanguíneas da mulher com que tiver vivido em M. inválido ou público concubinato, e vice-versa; g) parentesco legal, entre adoptante e adoptado, em linha recta ou em 2.º grau colateral (1094). NOTA: Deixaram de ser i.s a afinidade em linha colateral e o parentesco espiritual (entre padrinho/madrinha e afilhada/o). 4. Consentimento matrimonial. Para a validade do M. exige-se dos contraentes: a) o suficiente uso da razão, suficiente juízo acerca dos direitos e deveres essenciais do M., e suficiente capacidade para assumir as respectivas obrigações (1095); b) o conhecimento de que o M. é a união permanente ordenada à procriação dos filhos, o qual se pressupõe depois da puberdade (1096); c) a certeza acerca da pessoa com que se quer casar (1097); d) o não ser dolosamente enganado acerca de qualidade da outra parte susceptível de perturbar gravemente a vida conjugal; e) a não exclusão, no acto do consentimento, do próprio M. ou de algum dos elementos essenciais deste (1101); f) a ausência de liberdade, por violência ou medo grave (1103); g) a presença física no acto do consentimento, pelos próprios ou por procurador (1104); h) a clara expressão do consentimento, que pode ser por sinais nos que não puderem falar ou por intérprete de confiança (1104-1106). 5. Forma da celebração. (CDC 1108-1123; Preliminares do “Ritual do Matrimónio”, 28-38). Por exigência de segurança e dignidade do acto matrimonial, o Conc. de Trento (1563) instaurou a forma canónica de celebração do M. com a assistência do Ordinário ou do pároco, ou de um sacerdote ou diácono delegado pelo Ordinário ou pelo pároco, e ainda de duas testemunhas. O CDC (1116) prevê os casos de se não poder recorrer a assistente instituído (perigo de morte e falta desse assistente por mais de um mês), admitindo a validade do M. apenas perante as testemunhas. O M. deve celebrar-se, como regra, na paróquia de um dos nubentes, podendo o Ordinário autorizá-lo noutro lugar (CDC 1115). Quanto ao ritual, pode celebrar-se dentro da Missa (M. pro sponsis, se as rubricas permitirem) ou precedido de celebração da palavra. Deve de todo evitar-se a sua celebração na Sexta-Feira e Sábado Santos, e, quando em dia penitencial, isso deve ser tido em conta. A celebração do M. deve ser registada no livro paroquial próprio e averbada nos registos de Baptismo de ambos os cônjuges (e, entre nós, comunicada ao Registo Civil). Tal responsabilidade cabe ao pároco do lugar da celebração ou a quem fizer as suas vezes. Também devem ser averbados os casos de convalidação, de declaração de nulidade ou de dissolução. No caso de M. celebrado invalidamente, por defeito de forma canónica ou por impedimento, a sua convalidação pressupõe a cessação ou dispensa do impedimento e a renovação do consentimento, pelo menos da parte que tenha tido conhecimento da nulidade, ou de ambas, no caso de conhecimento público (CDC 1156-1160). Caso particular é a “sanação na raiz”, que consiste na convalidação do M. inválido, sem a renovação do consentimento (podendo mesmo os contraentes não chegarem a ter disso conhecimento), por concessão do Ordinário ou da Santa Sé (1161-1165). 6. Pastoral matrimonial. As repercussões do M. na vida do casal, da Igreja e da sociedade, apelam à sua cuidada preparação, tanto mais que a evolução sociocultural se caracteriza pela perda do sentido do sagrado, pela fuga aos compromissos e pela cultura do efémero e do prazer, com graves riscos para a estabilidade e fecundidade da instituição familiar. O CDC (1063-1072), os Preliminares do “Ritual do Matrimónio” (12-38) e a Exort. ap. *Familiaris consortio (IV parte) propõem uma pastoral matrimonial, da responsabilidade do bispo, dos párocos e seus colaboradores, e da comunidade dos fiéis, com as seguintes etapas: a) Preparação para o M., “remota” (educação e catequese das crianças); “próxima” (formação e catequese juvenil de tipo catecumenal); e “imediata” (dos noivos, nos meses anteriores ao casamento, numa linha de fé e de consciencialização das exigências da vida conjugal e familiar, e incluindo necessariamente o “exame pré-matrimonial” exigido pelo CDC e regulado pelas Normas da CEP (20.3.1984); b) Cuidada celebração, na fidelidade às normas canónicas e litúrgicas, combinada com os nubentes nos seus pormenores; c) Pastoral pós-matrimonial, que inclui o acompanhamento dos (jovens) casais na sua adaptação ao novo estado, sua eventual integração em equipas de entreajuda e formação, celebração das datas e acontecimentos significativos da sua vida, etc.; 7. Separação dos cônjuges (CDC 1141-1155). O M. rato e consumado só pode ser dissolvido pela morte. O M. não consumado pode ser dissolvido pelo Romano Pontífice, havendo justo motivo. O casamento entre duas partes não baptizadas, que em princípio é indissolúvel, pode excepcionalmente dissolver-se pelo “privilégio paulino” em favor da fé (1Cor 7,15), se uma das partes, que se converta e baptize, for pela outra repudiada (CDC 1132-1147). O homem (ou a mulher) por baptizar, a viver em regime de poligamia, quando se converte, tem que optar por um só dos cônjuges (“privilégio petrino”, cf. CDC 1148). Os cônjuges têm o direito e o dever de manter a comunhão na vida conjugal; mas pode haver motivos sérios (infidelidade, maus tratos…) que torne insuportável a comunhão de vida; podendo então o cônjuge inocente obter do Ordinário decreto de separação que, por não dissolver o vínculo, não permite novo casamento. A Igreja não reconhece o *divórcio, e priva dos sacramentos e de ofícios eclesiásticos (p.ex. ser padrinho/madrinha de Baptismo) o divorciado que torne a casar (civilmente). 8. Declaração de nulidade. Pode acontecer que, depois da celebração do M., se advirta na sua eventual invalidade, por motivo de impedimento não dispensado (V. acima 3), vício de forma ou falta de consentimento consciente e livre (por medo, erro, recusa de compromisso essencial do M., etc.). Então, ou se procede à convalidação do M. (se possível) ou uma ou as duas partes requerem a declaração de nulidade, o que implica a introdução da causa no competente tribunal eclesiástico. Todos os trâmites se encontram pormenorizadamente regulados no CDC 1671-1691 e na Instrução Dignitas Connubii (25.1.2005) do Pontif. Cons. para os Textos Legislativos (V. edição portuguesa da Universidade Católica, 2006). |
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